Histórias de superação e mudança de vida existem muitas, mas nada se compara a uma pessoa que nasceu de novo. Ezequiel Gomes, 49 anos, trabalha cerca de 15 horas diárias nas ruas de São Paulo. Ele é catador de lixo para reciclagem na periferia da zona norte da cidade.
Aos domingos, é o pastor Ezequiel, da Assembleia de Deus do Parque Edu Chaves. Homem de vida simples, foi ele mesmo quem mobiliou o templo onde prega. Com renda de pouco mais de mil reais por mês, o catador comprou bancos, filtro d’água e até uma bateria para o louvor.
A congregação reúne cerca de 40 fiéis para ouvir suas mensagens. Para Ezequiel, ser pastor é uma “missão”. “Cresci num bairro em que muita gente se desgarrou, mas não podemos ceder à tristeza”, explica. Sem perder o bom humor, conta que já teve uma vida diferente. Sua juventude foi marcada pelo envolvimento com o crime, que o levaram à prisão.
“Foram drogas e outras bobagens, mas foi preso que conheci a palavra de Deus”, testemunha. Já são quinze anos como catador. Antes disso, trabalhou como segurança e ajudante de pedreiro. Seu esforço cotidiano é agravado pelo fato de ter perdido o braço direito há 11 anos.
Após um acidente com um carrinho de entulho, foi a um hospital público. O plantonista “apenas aplicou uma injeção antitetânica” e o mandou para casa. Infelizmente, uma infecção resultou na amputação do braço. “Fiquei triste, mas logo esqueci a depressão e voltei a trabalhar, com alegria”, resume. Há nove anos move uma ação judicial contra o hospital, alegando erro médico no atendimento.
Sua atividade cotidiana segue um ritmo forte, quase sem pausas. Ainda que franzino, carrega até meia tonelada de material, dividida em três carrinhos. Explica que precisou se reeducar fisicamente.
“Aprendi a usar cada músculo de meu corpo e a força das coxas e do peito”, ensina. Usa o braço esquerdo e os dentes para atividades como fechar sacos e dar nós nas cordas da carga. Apesar das dificuldades aparentes, é um homem satisfeito. Chefe de uma família de nove pessoas, comemora: “Não tenho diversão maior do que encher a geladeira de casa”.
Fonte: Folha de SP