O lobista Fernando Baiano, um dos delatores da Operação Lava Jato, afirmou ao Conselho de Ética da Câmara nesta terça-feira que fez pessoalmente repasses no total de 4 milhões de reais ao presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ) entre 2011 e 2012. Esse valor seria referente ao pagamento de propina no esquema de corrupção da Petrobras. Cunha é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção e lavagem de dinheiro e responde a processo administrativo que pode levá-lo à cassação do mandato.
A oitiva de Baiano foi marcada por restrições ainda inéditas no colegiado: o lobista, apontado pela Lava Jato como o operador de propinas para o PMDB, foi ouvido sem a presença de câmeras de filmagens ou fotográficas. Dizendo-se "constrangido", ele compareceu ao plenário do conselho somente após a retirada dos aparelhos eletrônicos e de pessoas que, diante da sala lotada, se mantinham em pé. A defesa ainda tentou que a sessão fosse secreta, com a presença apenas de parlamentares, mas o pedido foi rejeitado.
Aos deputados, Baiano detalhou que se aproximou de Eduardo Cunha em 2010, após um pedido de doações financeiras para sua campanha eleitoral. O operador do PMDB afirmou ao peemedebista que as empresas que representava, por serem estrangeiras, não poderiam fazer as doações, mas mostrou outro caminho de conseguir o repasse: utilizando de sua influência política para pressionar o lobista Júlio Camargo a pagar a Baiano uma propina de inicialmente 16 milhões de reais, mas que acabou reduzida a 10 milhões. Se conseguisse, pagaria 50% do valor em comissão.
"Foi uma relação de troca", resume Baiano. "Tenho conhecimento de que ele recebeu em torno de 4 milhões de reais por mim e tinha ainda uma dívida de 3 milhões. Pelos cálculos, eram 7 milhões de reais que o Júlio deveria pagar. Acabou-se chegando a um acordo que pagaria 6 milhões, mas pelas contas que eu tenho deve ter recebido no máximo 5 milhões de reais", afirmou.
A pressão de Cunha, conforme o depoente, se deu por meio da apresentação de requerimentos perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara que prejudicavam o grupo Mitsui, ao qual Júlio Camargo era ligado. Os requerimentos foram apresentados pela ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada do peemedebista. Os repasses foram liberados após a investida de Eduardo Cunha.
Baiano afirmou que o dinheiro foi repassado por Júlio Camargo às contas mantidas no exterior pelo doleiro Alberto Youssef, que mandava o repasse de volta ao Brasil. Foram feitos, segundo o delator, entre cinco e seis repasses em espécie para pessoas indicadas por Eduardo Cunha. Baiano afirma ter visitado diversas vezes o presidente da Câmara em sua casa e no seu escritório, no Rio de Janeiro, e também diretamente em seu gabinete em Brasília.
O depoente ainda negou ser operador do PMDB: disse que, na verdade, em alguns de seus negócios na Petrobras foram solicitadas vantagens indevidas para políticos da legenda. "Em todo lugar tem gente boa e gente ruim. Não é verdade quando tentam imputar a corrupção aos empresários. A não ser o caso do Eduardo Cunha, eu nunca procurei nenhum político para oferecer dinheiro. Os pleitos sempre vinham dos políticos utilizando agentes políticos nas empresas públicas. Não são os empresários culpados pelo o que está acontecendo", afirmou.
Contas - Embora tenha arrastado Cunha para o escândalo de corrupção da Petrobras, o que já havia feito em acordo de delação, Fernando Baiano não tratou diretamente das contas mantidas pelo peemedebista no exterior, que é justamente o objeto da ação no Conselho de Ética. Cunha é alvo de processo por quebra de decoro por ter mentido à CPI da Petrobras sobre a manutenção dessas contas, que, de acordo com a Lava Jato, eram usadas para receber propina de dinheiro desviado da Petrobras. O delator disse que jamais fez repasses para contas do peemedebista, já que o acordo era que os pagamentos se dariam em espécie. Ele disse ainda desconhecer a existência de contas de Cunha no exterior.
A defesa de Eduardo Cunha tenta impugnar o depoimento sob o argumento de que não trata da denúncia oferecida ao Conselho de Ética. O vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), também já deu decisão de tornar nulas as provas que não estejam relacionadas ao escopo inicial. O comando do colegiado, no entanto, rebate que as novas informações surgidas ao longo das investigações não podem ser desconsideradas.
Fonte: Veja